segunda-feira, 27 de abril de 2009

Ligar os Pontos

Eu abandonei o Reed College depois de seis meses, mas fiquei enrolando por mais dezoito meses antes de realmente abandonar a escola. E por que eu a abandonei?
Tudo começou antes de eu nascer. Minha mãe biológica era uma jovem universitária solteira que decidiu me dar para adoção. Ela queria muito que eu fosse adotado por pessoas com curso superior. Tudo estava armado para que eu fosse adotado no nascimento por um advogado e sua esposa. Mas, quando eu apareci, eles decidiram que queria mesmo uma menina. Então meus pais, que estavam na lista de espera, receberam uma ligação no meio da noite com uma pergunta: "Apareceu um garoto. Vocês o querem?" Eles disseram: "É claro." Minha mãe biológica descobriu mais tarde que minha mãe nunca tinha se formado na faculdade e que meu pai nunca tinha completado o ensino médio. Ela se recusou a assinar os papéis da adoção. Ela só aceitou meses mais tarde quando os meus pais prometeram que algum dia eu iria para a faculdade.
E, 17 anos mais tarde, eu fui para a faculdade. Mas inocentemente escolhi uma faculdade que era quase tão cara quanto a Stanford. E todas as economias dos meus pais, que eram da classe trabalhadora, estavam sendo usados para pagar as mensalidades. Depois de 6 meses, eu não podia ver valor naquilo. Eu não tinha idéia do que queria fazer na minha vida e menos idéia ainda de como a universidade poderia me ajudar naquela escolha. E lá estava eu gastando todo o dinheiro que meus pais tinham juntado durante toda a vida. E então decidi largar e acreditar que tudo ficaria OK. Foi muito assustador naquela época, mas olhando para trás foi uma das melhores decisões que já fiz. No minuto em que larguei, eu pude parar de assistir às matérias obrigatórias que não me interessavam e comecei a frequentar aquelas que pareciam interessantes. Não foi tudo assim romântico. Eu não tinha quarto no dormitório e por isso eu dormia no chão do quarto dos amigos. Eu recolhia garrafas de Coca-Cola para ganhar 5 centavos, com os quais eu comprava comida. Eu andava 11 quilômetros pela cidade todo domingo à noite para ter uma boa refeição no templo hare-krishna. Eu amava aquilo. Muito do que descobri naquela época, guiado pela minha curiosidade e intuição, mostrou-se mais tarde ser de uma importância sem preço.
Vou dar um exemplo: o Reed College oferecia naquela época a melhor formação de caligrafia do país. Em todo o campus, cada poster e cada etiqueta de gaveta eram escritas com uma bela letra de mão. Como eu tinha largado o curso e não precisava frequentar as aulas normais, decidi assistir às aulas de caligrafia. Aprendi sobre fontes com serifa e sem serifa, sobre variar a quantidade de espaço entre diferentes combinações de letras, sobre o que torna um tipografia boa. Aquilo era bonito, histórico e artisticamente sutil de uma maneira que a ciência não pode entender. E eu achei aquilo tudo fascinante. Nada daquilo tinha qualquer aplicação prática na minha vida. Mas 10 anos mais tarde, quando estávamos criando o primeiro computador Macintosh, tudo voltou. E nós colocamos tudo aquilo no Mac. Foi o primeiro computador com tipografia bonita. Se eu nunca tivesse deixado aquele curso na faculdade, o Mac nunca teria tido as fontes múltiplas ou proporcionalmente espaçadas. E considerando que o Windows simplesmente copiou o Mac, é bem provável que nenhum computador as tivesse. Se eu nunca tivesse largado o curso, nunca teria frequentado essas aulas de caligrafia e os computadores poderiam não ter a maravilhosa caligrafia que eles têm. É claro que era impossível conectar esses fatos olhando para frente quando eu estava na faculdade. Mas aquilo ficou muito, muito claro olhando para trás 10 anos depois.
De novo, você não consegue conectar os fatos olhando para a frente. Você só os conecta quando olha para trás. Então têm que acreditar que , de alguma forma, eles vão se conectar no futuro. Você tem que acreditar em alguma coisa - sua garra, destino, vida, karma ou o quer que seja. Essa maneira de encarar a vida nunca me decepcionou e tem feito toda a diferença para mim.

(Discurso de Steve Jobs, para os formandos da Universidade de Stanford - USA)

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